ALQUIMIA – Algumas definições históricas


ALQUIMIA – Algumas definições históricas

Nelson Lage da Costa
Mestre em Ensino de Ciências




Como se define “Alquimia”?

De forma bem didática, vamos tratar neste artigo, de alguns fatos históricos sobre os primórdios históricos da alquimia, baseados nos trabalhos de Juergen Heinrich Maar (2008), História da Química (Primeira Parte – Dos Primórdios a Lavoisier) e Raphael Patai (2009), Os Alquimistas Judeus. Em todos os sentidos, este artigo visa apenas comentar os aspectos tratados nestas duas grandiosas obras.
De acordo com Maar (2008), são muitas as definições de Alquimia. Em muitas delas, há a indicação de ser uma pseudociência que se ocupava da transmutação dos metais em ouro e prata e, ao mesmo tempo, buscava uma “cura” para todos as doenças, além de uma maneira de prolongar a vida.
No trabalho de H. J. Sheppard surge, no entanto, uma definição de vai mais longe: “A Alquimia é a arte de liberar partes do Cosmos de sua existência temporal e alcançar a perfeição, que para o metal é o ouro, e para o homem a longevidade; e a seguir a imortalidade e por fim a redenção”. Neste caso, a busca da Pedra Filosofal para os metais; o Elixir da vida para os humanos e o enobrecimento espiritual através de alguma forma de revelação interna ou iluminação. Há autores que também afirmam ser a Alquimia uma forma de conhecimento da natureza.
Patai (2009) afirma que a Alquimia é basicamente um empreendimento espiritual, cujo propósito é transmutar a imperfeita alma humana em uma entidade espiritual mais perfeita.
Heinrich Khunrath (1560 – 1601) interpretava a transmutação como um processo mítico que ocorria no interior da alma do adepto.
Ainda de acordo com Maar (2008), há mesmo historiadores, em particular os críticos que duvidam se o que chamam de “pseudociência”, como as teorias de Freud e de Jung, podem explicar de forma ampla, outra “pseudociência”. Tal dilema já fora entendido pelo grande estudioso da Alquimia, John Read (1884 – 1963) pois nessa rede entrelaçam-se aspectos de uma química rudimentar, religião, mitos, folclore, misticismo, filosofia e muitos outros campos da experiência humana. Ou seja, a Alquimia era muito mais do que uma forma rudimentar de ciência experimental.
Ainda sob os registros de Patai (2009, p. 99), “Tanto em termos da teoria quanto da prática da alquimia, e seus ensinamentos, em muitos casos na forma de concisos aforismos, são citados como se fossem pronunciamentos proféticos”.
Todavia, os alquimistas de tendência mística desprezavam os que trabalhavam na transmutação dos metais, chamando-os de “sopradores” e “charlatães fuliginosos”.
Podemos então, separar alguns diferenciais sobre a Alquimia:
A interpretação subjetiva de dados empíricos (observador integra-se ao observado); a possibilidade da revelação como forma de aquisição de conhecimento; a imaginação (no sentido de especulação sem confirmação empírica) tem lugar na teoria; uma visão unificada do conhecimento da natureza; definição de objetivos amplos e permanentes.

De onde são os primeiros escritos alquimistas?
Encontramos registros alquímicos em povos Alexandrinos, Judaicos, Islâmicos, Hindus, Chineses, Babilônicos.
Maar (2008) nos informa que a Alquimia Greco-egípcia ou alexandrina nasceu entre os séculos III a.C. e I a.C. na cidade de Alexandra, de uma combinação de artes práticas dos antigos, sobretudo dos egípcios e mesopotâmicos; de filosofia grega e do misticismo hebraico e persa.
A filosofia Grega deu à prática alquímica consistência de uma doutrina que se desenvolveu logo em duas direções: a alquimia prática e a alquímica espiritual ou simbólica.
Plotino (205-270 d. C.), o filósofo neoplatônico helenístico, com sua procura mística de união com o bem, através da inteligência, constitui-se como ponto de ligação entre a filosofia grega e a sapiência alexandrina. Esta sabedoria aparece em Alexandria, entre o terceiro século antes e o terceiro depois de Cristo, como resultado de um sincretismo do neoplatonismo grego, da cabala judaica, da mântica caldaica e da mítica egípcia.
Os mistérios do Egito são os testemunhos do parentesco entre doutrinas caldaicas, a literatura hermética e o neoplatonismo; pois, uma das fontes de Jâmblico seriam os Oráculos Caldaicos, redigidos no segundo século da era atual, onde velhos mitos babilônicos são associados a teorias filosóficas em torno da heliolatria zoroastriana.
Um célebre alquimista bizantino que também possui trabalhos alquímicos é Olimpiodoro (século V), considerado o autor do livro Sobre a Sagrada Arte da Pedra Filosofal - o qual testemunha a alquimia bizantina nos mesmos moldes que a helenística. Olimpiodoro era cristão e, além disso, versado na filosofia grega. Portanto, para ele, o processo alquímico não necessitava da magia para realizar-se, mas, era possível ser compreendido pela teoria grega aliada à mística cristã. O próprio desenvolvimento do “fogo grego” é uma prova concreta desta teoria e registro ao mundo cristão o charlatanismo mágico.
Olimpiodoro procurava interpretar os textos e receitas alquímicas "sérias" baseando-se nas escrituras, entendendo o sentido último de ambos, não os aceitando literal, mas simbolicamente. Um texto de Olimpiodoro foi citado e interpretado sobre este enfoque, por Marie Louise von Frans (1982), onde se descreveu a transformação de algo personificado no Adão original - o homem moldado de barro, a matéria-prima original, a substância assimilada ao chumbo no processo alquímico.
Tudo isso era, para Olimpiodoro, expressão simbólica do desejo de perfeição e imortalidade humana. Assim, a alquimia seria para Olimpiodoro mais um processo mental que uma sabedoria da matéria. Aliás, isso já era sustentado, quase um século antes, por Sinésio de Cirene (c370-413), bispo de Ptolemais, na Líbia.
Podemos citar ainda o tratado de Zózimo, o Panopolitano (século III ou IV) que foi considerado uma das maiores figuras da alquimia helenística, e que era considerado judeu por alguns autores alquimistas árabes da Idade Média.
Baseado em Maar, a segunda grande etapa da história da Alquimia é a Alquimia árabe ou islâmica, que se estende do século VIII ao século XIII. Segundo o autor, é mais correto dar referência à Alquimia islâmica já que seus participantes não eram apenas árabes, mas também reunia personagens persas, curdos, africanos do norte, ibéricos e centro-asiáticos.
A Alquimia hindu é um dilema segundo Maar. Há questionamentos sobre se esta é tão ou mais antiga do que a Alquimia chinesa. Pergunta-se ainda se esta teria sofrido influência árabe. No entanto, James Partington (1886 – 1965) tradutor do sânscrito para o árabe de tratados hindus, afirma que os hindus não davam muita importância para a Alquimia.
O primeiro a chamar a atenção para a importância da Alquimia chinesa e sua possível ligação com a Alquimia europeia foi o norte americano W. A. P. Martin em 1881. De um modo geral tem-se hoje como certo o surgimento da Alquimia chinesa com o desenvolvimento do Taoísmo.
Embora tenha havido uma intensa atividade química na Mesopotâmia, em termos de metalurgia, cerâmica, vidros, drogas, trata-se de técnicas e de artes práticas primitivas, faltando para ser Alquimia, a componente simbólico-espiritual. Desta forma, apesar de refutada, Micea Eliade (1907 – 1986) nos conduz a esta hipótese.

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